Specialist AO – Dr.ª Paula Boiça [PwC Director] – Desvalorização cambial e a preparação de demonstrações financeiras

Num momento crucial para as empresas em Angola, num cenário de desvalorização cambial, implementação do IVA, orientação para a captação de investimento e diversificação da economia, a Contabilidade e os profissionais desta área são elementos chave para o processo da tomada de decisão e para a produção de informação financeira de qualidade.

De facto, esta ciência agrega um conjunto de dados económicos e financeiros úteis e cruciais para diversos stakeholders: Gestores, Investidores, Financiadores, Empregados, Fornecedores, Clientes, Sector Público e Sociedade em geral.

A desvalorização cambial ocorrida em 2018, o seu correcto tratamento contabilístico e impacto nas Demonstrações Financeiras é um dos desafios dos profissionais da área Financeira.

A moeda nacional, Kwanza (AOA), desvalorizou-se face ao Dólar Americano (USD), até ao presente momento, mais de 80%, iniciando 2018 nos 165.924, encontrando-se, actualmente, nos 310.454. Esta desvalorização, conjugada com a taxa de inflação na ordem dos 23% , tem um impacto significativo nos resultados das Empresas, que, regra geral, não conseguem repercutir no preço dos seus bens e serviços, o acréscimo de preço na base do custo.

Este cenário é agravado, quando as Empresas para o desenvolvimento da sua actividade económica, recorrem a importações de bens e à aquisição de serviços no estrangeiro e, por isso, nas suas Demonstrações Financeiras (DFs) figuram transações em moeda estrangeira, que no caso específico dos passivos monetários, podem permanecer no Balanço por longos períodos, devido às restrições cambiais.

Considerando o impacto significativo que a desvalorização do AOA poderá originar nas DFs das Empresas no exercício de 2018, importa relembrar o que preconiza o normativo contabilístico em vigor em Angola, Plano Geral de Contabilidade (PGC), relativamente à valorimetria das transações em moeda estrangeira.

As políticas contabilísticas do PGC, incluem no ponto 7 – Valorimetria, as Bases de valorimetria específicas – Transações em moeda estrangeira (subponto 7-2.1), que refere o seguinte:

“As transacções em moeda estrangeira devem ser valorizadas na moeda de relato.
No momento do reconhecimento inicial, as transacções em moeda estrangeira são valorizadas na moeda de relato determinada pela aplicação, à quantia de moeda estrangeira, da taxa de câmbio entre a moeda estrangeira e a moeda de relato à data da transacção.

Na data de relato, as transacções em moeda estrangeira são valorizadas na moeda de relato da seguinte forma:

• Pelo valor histórico (valorização do reconhecimento inicial), no caso de activos monetários em que o câmbio tenha sido previamente fixado
• Pelo valor histórico (valorização do reconhecimento inicial), no caso de activos não – monetários aos quais, na data do reconhecimento inicial, tenha sido atribuído um justo valor em moeda estrangeira
• Pela taxa de fecho determinada pela aplicação, à quantia da moeda estrangeira, da taxa de câmbio à data de fecho entre a moeda estrangeira e a moeda de relato, no caso de activos monetários cujo câmbio não esteja previamente fixado”
Adicionalmente, as regras de valorimetria para as contas a receber e contas a pagar (subpontos 7-2.6 e 7-2.7), referem que “o custo histórico é o valor de registo inicial eventualmente corrigido para reflectir as seguintes situações:
• (…)
• Diferenças de câmbio não realizadas determinadas pela aplicação da taxa de câmbio à data de fecho às quantias em moeda estrangeira em dívida na data de relato.
• (…)”
Face ao exposto, pelo menos a 31 de Dezembro de 2018, aquando da preparação das Demonstrações Financeiras de final do ano, as Empresas, para além das diferenças cambiais realizadas (reconhecidas no momento do recebimento e pagamentos, de e a terceiros, relativas a transações em moeda estrangeira), devem proceder à actualização dos saldos de activos e passivos monetários denominados em moeda estrangeira, de acordo com a taxa de câmbio de fecho, reconhecendo na Demonstração dos Resultados, as diferenças de câmbio não realizadas, favoráveis e desfavoráveis.

Assim, como tarefa de fecho de exercício, os responsáveis financeiros, para garantir informação financeira de qualidade, devem analisar as principais rubricas dos activos e passivos monetários denominadas em moeda estrangeira, das quais destacamos, Disponibilidades, Clientes e Fornecedores, e proceder à actualização dos valores em AOA de acordo a taxa de câmbio de fecho (31 de Dezembro de 2018).

Importa também referir que as diferenças de câmbio ao serem reconhecidas no resultado do exercício, impactam a estimativa de imposto, pelo que, para efeitos de determinação do Imposto Industrial terá que ser garantido o cálculo de acordo com as regras contabilísticas. Alertamos ainda para o facto de o cálculo diferenças cambiais se encontrar devidamente suportado, sob pena de serem desconsiderados para efeitos fiscais, principalmente na vertente do custo, em processos posteriores de inspecção tributária.

Paula Boiça
Director
PwC Angola

Notas de rodapé:

(1) De acordo com a previsão para 2018 na proposta do Orçamento de Estado 2019

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