Foi publicado, no dia 30 de Novembro, o Decreto Presidencial n.º 289/18, (neste artigo somente por “DP”) que estabelece os termos e condições para a aplicação dos recursos repatriados voluntariamente, para além de fixar também o regime jurídico da autorização para a emissão de Títulos de Dívida Pública pelo Titular do Departamento Ministerial responsável pelas Finanças Públicas no âmbito do regime previsto na Lei n.º 9/18, de 26 de Junho – Do Repatriamento de Recursos Financeiros.
Com o presente artigo pretendemos elucidar os aspectos legais mais relevantes em relação aos termos e condições supra referidos face à Lei n.º 10/18, de 26 de Junho (adiante designado por LIP) sendo que, por esta razão, excluímos, embora façamos algumas referências, a abordagem no âmbito da emissão de Títulos de Dívida Pública.
Posto isto, convém referir que o primeiro aspecto específico importante a reter do regime de aplicação dos recursos repatriados voluntariamente prende-se com o facto de, conforme na al. a) do n.º 1 do art.º 3 do DP, preceituar que no mínimo 75% do montante a ser transferido ter que ser investido em projectos de investimento privado nos sectores de actividade prioritários estabelecidos no art.º 28 da LIP. Esta norma define como prioritários os seguintes sectores de actividade: educação, formação técnico-profissional, ensino superior, investigação científica e inovação, agricultura, alimentação, agro-indústria, unidades e serviços especializados de saúde, reflorestamento, transformação industrial de recursos florestais e silvicultura, têxteis, vestuário e calçado, hotelaria, turismo, lazer, construção, obras públicas, telecomunicações e tecnologias de informação, infra-estruturas aeroportuárias e ferroviárias, produção e distribuição de energia eléctrica, saneamento básico, recolha e tratamento de resíduos sólidos.
No que tange ao procedimento a ser atendido, refira-se que o n.º 2 do art.º 3 do DP determina que as operações de investimento privado dos projectos que vierem a ser desenvolvidos com recursos a serem repatriados devem seguir o que consta na LIP em relação as que constituem investimento interno. Fica, por isso, claro que estes projectos não conferem o direito de repatriamento dos lucros que resultem dos mesmos.
O órgão competente para registar os projectos é a Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações (AIPEX), com excepção dos investimentos que venham a ser desenvolvidos através de Organismos de Investimento Colectivo. De acordo com o n.º 2 do art.º 5 estes investimentos devem ser sujeitos à supervisão da Comissão de Mercado de Capitais.
Não obstante a competência que é acometida à AIPEX, no momento de recepção dos recursos – que é prévio ao pedido de registo do projecto de investimento que deve ser feito à referida instituição – no acto de recepção dos recursos repatriados as instituições financeiras bancárias devem obter os respectivos titulares (que são os investidores), a definição dos montantes a serem investidos, indicando, para o efeito a via pela qual farão o investimento.
No que toca ao prazo de execução dos projectos, o que é bastante relevante pois no regime aplicável aos projectos não há determinação de qualquer prazo, o n.º 1 do art.º 5 preceitua que os projectos de investimento que vierem a ser executados com recursos repatriados devem ser submetidos à AIPEX num prazo máximo de até 60 (sessenta) dias da data da recepção dos recursos pela instituição bancária domiciliada em território nacional.
O n.º 3 do mesmo artigo fixa que os projectos devem iniciar a sua execução no prazo de 90 (noventa) dias contados da data de apresentação do projecto à AIPEX, porém, este prazo pode ser prorrogado para até 180 dias, sendo que nestes casos o investidor deve solicitar à citada instituição apresentando fundamentadamente as razões.
Embora o legislador não se tenha referido a expressão “registo” dos projectos na AIPEX, que é a que vem prevista quer na LIP quer no seu Regulamento para definir o acto de submissão das projectos de investimento privado à AIPEX, parece-nos ser um falso problema pois entendemos que – tal como acontece com os demais projectos – visa-se, fundamentalmente, a obtenção do Certificado de Registo de Investimento Privado.
Também à AIPEX compete acompanhar e fiscalizar a boa execução dos projectos de investimento que lhe são submetidos no âmbito sobre o qual nos temos vindo a referir.
Iremos, num próximo artigo, abordar desenvolvidamente a questão do acompanhamento e fiscalização dos projectos, porém, convém sublinhar que o regime actual previsto no Regulamento da LIP e que orienta a actividade da AIPEX neste âmbito, inova no sentido de apenas obrigar as sociedades veículos dos projectos, diferente do que acontecia nos regimes anteriores, a elaborarem e apresentarem relatórios na fase de implementação dos projectos.
É o que vem previsto no n.º 1 do art.º 17 do citado diploma. Resulta do n.º 2 do mesmo artigo que após a fase de implementação, estando na fase de exploração do investimento, só tem a obrigação de fornecer informações se lhe forem solicitadas pelos serviços de acompanhamento e fiscalização da AIPEX.
Em face do que expusemos e apesar de ser tardia a aprovação e publicação do Decreto Presidencial n.º 289/18, de 30 de Novembro, porquanto o prazo para o repatriamento voluntário previsto na Lei n.º 9/18, de 26 de Junho terminará em Dezembro do ano em curso, parece-nos ter sido uma boa opção a regulação dos investimentos que vierem a ser realizados seguirem o previsto na LIP com as especificidades que tivemos a oportunidade de apresentar.