A Bolsa da Dívida e Valores de Angola (Bodiva) começou a emitir, desde o dia 11 de dezembro de 2018, obrigações corporativas do Standard Bank Angola para negociação, no valor de 4,7 mil milhões de kwanzas ( 15 milhões de dólares), dos AKz 9,5 mil milhões previstos.
A iniciativa do Standard Bank Angola marca um momento histórico para a economia angolana, por inaugurar o mercado de bolsa de obrigações privadas da Bodiva, sendo as primeiras obrigações corporativas cotadas em bolsa.Depois de um “roadshow” de lançamento desta emissão, realizado em Novembro de 2018, com cerca de 100 investidores em formato de conferência, esta emissão corresponde a uma primeira tranche de cerca de 50% do Programa de Emissão de Obrigações do Standard Bank Angola no valor global de 9,5 mil milhões, aprovado pela Comissão de Mercado de Capitais.
Com uma taxa de cupão anual de 17%, com uma taxa fixa/variável com pagamento de cupão semestral,o Standard Bank é o agente de intermediação, através da sua divisão de Corporate and Investiment Banking (CIB).
Uma obrigação é um título de dívida que é emitido por quem quer pedir dinheiro emprestado (pode ser uma empresa, um Estado) dispondo-se ou obrigando-se a remunerar com um juro o valor que lhe emprestem. Geralmente, os investidores em obrigações são instituições que poderão depois vender em retalho (nos balcões dos bancos, por exemplo) os títulos da dívida que compram, nomeadamente, através de fundos de investimento.
Note-se que o mercado no qual o emitente da dívida vende directamente as obrigações aos seus credores chama-se mercado primário. As transações dessas mesmas obrigações que ocorram nos momentos posteriores (que já não deverão envolver quem as emitiu) realizam-se em mercado secundário.
Havendo inúmeras variações para os tipos de obrigações, detenhamo-nos numa clássica obrigação de taxa fixa. Tipicamente as obrigações de taxa fixa pagam um valor constante, por exemplo 5 000 AOA por ano (ou cupão), sobre o valor nominal a que foram emitidas (por exemplo: 100 000 AOA cada), ou seja, pagam 5% de juros ao ano havendo lugar à devolução do valor emprestado no último ano do contrato de empréstimo, por exemplo, no 10º ano. Em suma, quem comprar as obrigações e as mantiver até ao fim do contrato deverá esperar receber exatamente 5000 AOA por cada 100 000 AOA investidos, em cada ano, com a amortização da dívida a coincidir com o fim do contrato.
Mas se são obrigações de taxa fixa como pode a sua taxa de juro subir frequentemente?
A taxa fixa refere-se ao que foi estabelecido entre o emitente das obrigações e o seu portador, mas o portador das obrigações pode mudar durante o período de vida da obrigação (via mercado secundário). O primeiro comprador da obrigação é habitualmente livre de vender as obrigações que comprou a terceiros e por aí adiante e é na definição do preço entre as partes que as coisas começam a mudar.
Por exemplo, vamos supor que o Agente A comprou 10 obrigações do Banco XPTO, a 10 anos, a 100 000 AOA por cada obrigação com taxa fixa de 5% ao ano (que é o mesmo que dizer com um cupão de 5 000 AOA), mas entretanto precisou do dinheiro antes dos 10 anos (ou encontrou um negócio melhor) e encontrou o agente B que quer comprar este título da dívida do Banco XPTO. Só que o Agente B acha que receber 5% ao ano é pouco atendendo a que ouviu notícias de que emprestar dinheiro ao Banco XPTO se está a tornar mais arriscado estando ciente de que, no final do prazo do contrato, pode não ter dinheiro para devolver a totalidade ou pelo menos parte daquilo que pediu emprestado.
Imagine-se que, devido a isto, o Agente B não está disposto a pagar 100 000 AOA por cada obrigação (conforme o valor nominal inicial inscrito no contrato da obrigação) mas apenas 80 000 AOA. Admita-se também que o agente A, por que precisa do dinheiro (ou, como dissemos, porque descobriu outro negócio que julga mais rentável ou ainda por outra razão que avançaremos mais adiante) aceita vender mesmo perdendo uma parte do investimento inicial.
Neste caso, o Agente B fica com as mesmas 10 obrigações que dão direito aos mesmos 5 000 AOA ao ano sobre o valor nominal inicial do contrato. Só que, então, a taxa de juro que ao Agente B obtém já não será de 5 000 AOA por cada 100 000 AOA investidos (os tais 5%), mas 5 000 AOA por cada 80 000 AOA investidos (aquilo que ele de facto pagou pelas obrigações ao agente A). Na prática, uma taxa de juro bruta de 6,25%. A esta taxa de juro chama-se yield e, como se vê, tenderá a aumentar sempre que o preço das obrigações no mercado secundário desça.
Numa frase: os 5 000 AOA/ano de retorno pago por quem emitiu a obrigação são fixos (salvo incumprimento) mas como o preço das obrigações em mercado secundário pode diferir do valor nominal inicial, a taxa de juro também se torna variável.
Note que o agente A (não considerando os juros que possa ter recebido ao longo dos anos em que possa ter detido as obrigações), aceitou perder 20% do investimento inicial e pode com isso estar a achar que, se mantivesse as obrigações até à maturidade (durante os 10 anos contratados), poderia vir a perder ainda mais dinheiro, dispondo-se então a vendê-las, encaixando a perda. É por isso que a yield das obrigações dá uma ideia do risco de incumprimento por parte do emitente e, naturalmente, acaba por determinar qual a taxa de juro ou valor do cupão de qualquer emissão nova que o mesmo emitente tente colocar no mercado.
No exemplo dado, o cupão de uma nova emissão da mesma empresa teria de ser claramente superior aos 5 000 AOA/ano pagos na emissão anterior, de modo a poder cativar os investidores. Deverá oferecer logo no contrato, uma taxa de juro anual (um cupão fixo sobre o valor nominal) próxima da yield que está em vigor no mercado secundário, sob pena de o investidor estar a perder dinheiro logo à partida. Na prática, o preço de ir vender a obrigação no minuto seguinte a tê-la comprado deverá ser muito próximo e, como tal, a taxa de juro garantida no cupão da nova obrigação terá de ser muito próxima da implícita (a yield) em vigor no mercado secundário.
Entretanto,as obrigações também são sujeitas a fiscalidade(Imposto sobre aplicação de capitais e selo) e a custos administrativos (são várias as comissões aplicáveis e variam de intermediário para intermediário). A taxa de juro real que irá obter é diferente da anunciada. Convém fazer as contas e, por exemplo, ponderar se o diferencial real positivo que eventualmente exista numa obrigação face a um depósito a prazo, compensa minimamente o risco habitualmente muito superior presente numa obrigação.