Specialist AO – Dr. Paulo Gungui – Economista

“Façamos da Agricultura a alavanca para a diversificação económica”

“A Agricultura é a base e a Indústria o factor decisivo”. Este é, e será sempre um slogan muito actual, proferido em 1975, pelo fundador da Nação, por mais que passam anos, décadas e até mesmo séculos, teremos este célebre slogan sempre presente.

Falar do sector agrícola no País, nos remete a uma reflexão profunda, na qual recomenda-se soluções assertivas e imediatas, entretanto, o processo da diversificação económica deve passar por este sector, pois, não podemos perder de vista a Agricultura como base fundamentalmente para garantir a auto-suficiência alimentar, satisfazer as necessidades internas, bem como, exportar o excedente, para que o País, possa arrecadar divisas e alavancar os outros sectores económicos, e, consequentemente sair da crise económica e financeira, derivada das constantes quedas da nossa principal commodity no mercado internacional.

Recorrendo aos principais factores económicos de produção, nomeadamente; à terra, podemos estabelecer uma relação com a Fisiocracia, sendo uma teoria econômica desenvolvida século XVIII, na qual defende que a riqueza das nações é derivada essencialmente do valor das “terras agrícolas” e/ou do “desenvolvimento da terra”. Os Fisiocratas defendiam veementemente que só a “terra” tinha a capacidade de multiplicar riquezas.

Apesar desta teoria ser bastante discutida, os factos actuais nos mostram que não é mal de todo pensar desta forma. O economista britânico Thomas Robert Malthus, defendeu este conceito, prognosticando o crescimento populacional e a produção de alimentos (teoria malthusiana). Para Malthus, a produção de alimentos crescia de forma aritmética, enquanto o crescimento populacional crescia de forma geométrica, superando a oferta de alimentos, o que resultaria em problemas como a fome e a miséria. Aliás, é só vermos que constam dos compromissos do Relatório de Malabo para África, a redução da pobreza para metade, por meio da Agricultura até 2025.

O mais recente Relatório de Malabo (Guiné Equatorial), sobre o crescimento e transformação acelerada da Agricultura para a partilha da prosperidade e melhoria dos meios de subsistência, avalia Angola com a pontuação de 2.10, uma classificação global “não em boa via”, se comparamos com os restantes País de África.

Relatório é bienal, e tem por objectivo reforçar a capacidade institucional, nacional e regional para a produção de dados sobre a Agricultura e a gestão do conhecimento, o que permitirá, não só apoiar a melhoria do planeamento, da implementação, monitorização, avaliação com base em dados comprovados, mas também, estabelece as bases e as vias para iniciar programas de acção continental para impulsionar colectivamente a transformação da Agricultura em África.

No mesmo Relatório, foram feitas algumas recomendações, para Angola, tais como:

-Acelerar o processo do Programa Compreensivo de Desenvolvimento da Agricultura Africana (CAADP),através do desenvolvimento e implementação de um Plano Nacional de Investimento na Agricultura (PNIA) para que o País possa honrar os compromissos de Malabo;

– Afectar/alocar mais fundos para a investigação e desenvolvimento agrícola, e criar um ambiente que permita que os homens e mulheres agricultores tenham acesso ao financiamento agrícola, e;

– Reforçar a sua capacidade e os sistemas de recolha de dados e de gestão para reportar sobre os indicadores do CAADP/Malabo, e informar melhor a planificação baseada na evidência para o desenvolvimento do sector agrícola.

No âmbito da coordenação conjunta da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e do Mercado Comum da África Oriental e Austral (COMESA), os Países apresentaram os respectivos relatórios, representando uma taxa de apresentação de 100%. A pontuação geral média da região é de 4.02, o que indica que a Região está bem encaminhada para cumprir com os compromissos do CAADP/Malabo, quando avaliados em relação ao parâmetro de referência de 3.94 para 2017. Apesar disso, Angola teve uma pontuação baixa em relação aos nossos “vizinhos”.

Angola é o 7º (sétimo) maior País africano em termos de dimensão territorial com uma superfície de 1.246.700 km2, e o 22º (vigésimo segundo), a nível mundial. Possui terras bastante aráveis, clima, e solos extremamente férteis para Agricultura. Porém, os dados apresentados pelo País nos Relatórios nacionais e até mesmo internacionais, não são animadores.

De acordo com os dados do Relatório do Plano de Desenvolvimento de Médio Prazo, quando analisamos o subsector agrícola, para o período 2018 -2022, podemos constar, que os esforços têm sido feitos, porém, há ainda muito por fazer, e isto só depende de nós (angolanos).

O Relatório cita que 47% da superfície de terra do País, i.e, 58.000.000 hectares (ha), é propício para o exercício da actividade agrícola. No entanto, deste potencial, apenas 10% está a ser actualmente explorado, ou seja, 5.744.815 hectares (ha).

Porém, 0,2% da superfície semeada está irrigada, o restante depende das condições climatéricas do País.

Aponta ainda alguns factores que podem fazer com que não alcancemos os objectivos para o período em referência, tais como:

-A falta de sistema de mercado nacional, grossista e retalhista, para o escoamento dos produtos agrícolas, pecuárias e silvícolas, o que carece de coordenação de esforços entre o sector agrícola com os sectores do comércio e do transporte.

-A mão-de-obra especializada é insuficiente, em parte causada pelo défice de ingresso de técnicos para a extensão rural assim como pela fraca contratação de quadros por parte do sector empresarial.

-A nível do sector familiar, a ausência de mão-de-obra qualificada tem um grande impacto na qualidade e produtividade das culturas.

– No domínio da exploração empresarial, existe uma certa dependência de mão-de-obra estrangeira o que encarece os custos de produção.

-Regista-se uma carência de quadros formados e capacitados. Esta situação é derivada do facto do modelo de formação técnica e desenvolvimento de quadros ser inadequado, consubstanciado pela falta de articulação entre as reais necessidades técnicas do sector e os programas curriculares das instituições de ensino, recorrendo a formação especializada no exterior com elevado custo e reduzido número de formandos.

Com base no Orçamento Geral do Estado (OGE), economia angolana continua fortemente exposta à volatilidade do preço do petróleo no mercado internacional e à queda da produção petrolífera nacional.

As projecções do OGE, tem uma forte correlação, com o preço do barril do petróleo, quase que descorando as outras receitas com o sector não petrolífero. Prova disso, são as constantes revisões no OGE, resultantes dos choques da queda abrupta do preço do petróleo, no período de 2014 à 2017, que tiveram um impacto significativo nos fundamentos macroeconómicos e na estrutura da economia angolana, fruto disso, foram as várias revisões nos orçamentos, para tentar ajustar a variações macroeconómicas, foi assim em 2015,2016, 2019 e, prevê-se uma proposta de revisão para 2020.

O OGE 2020, fez projecções com as despesas no montante de 15 970 605 826 135,00 (Quinze biliões, novecentos e setenta mil milhões, seiscentos e cinco milhões, oitocentos e vinte e seis mil e cento e trinta e cinco kwanzas), e receitas no mesmo valor.

O valor de receitas e despesas do OGE 2020, representa um aumento de 53,5% relativamente ao OGE Revisto de 2019, apesar de estimar uma taxa de crescimento do PIB, para sector não petrolífero. Para a Agricultura prevê-se um maior crescimento deste sector em 2020, à uma taxa de 3,1%, contra o registo de 1,8% estimado para 2019. Em relação às despesas por funções com a Agricultura, o OGE, prevê uma dotação de 205.364.413.792,00 (Duzentos e cinco mil milhões, trezentos e sessenta e quatro milhões, quatrocentos e treze mil e setecentos e noventa e dois kwanzas). Porém, ainda bastante insuficiente para um sector que se pretende ser decisivo.

No entanto, parece que o crescimento do País estará longo de acontecer, pois, a economia de Angola está a enfrentar um crescimento negativo desde 2016, segundo as últimas projecções das Perspetivas Económicas Regionais para a África Subsariana de 2020 do Fundo Monetário Internacional (FMI) elaborado em Abril deste ano, face ao impacto da Covid -19 na economia mundial. Em termos globais, prevê-se que o crescimento na África Subsariana em 2020 será de -1,6%, um mínimo histórico. Para o País as projecções foram de 2019 e 2020, com recessões de -1.5%, -1.4%,respectivamente, e o regresso ao crescimento só deverá acontecer em 2021, onde o FMI aponta uma expansão de 2,6%.

A Organização das Nações Unidas para Alimentação a Agricultura (FAO), estabelece nos 17 objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODM), o alcance da fome zero, para a nova agenda que vai até 2030.

A FAO estabeleceu sua representação em Angola deste 1982, assim, nesses primeiros anos, a cooperação da FAO em Angola concentrou-se na assistência emergencial, notadamente o fornecimento de insumos agrícolas como sementes, fertilizantes e ferramentas para o rápido restabelecimento das atividades agrícolas.

Desde 2005, a ênfase do trabalho da FAO em Angola passou para a reabilitação e o desenvolvimento agrícola, particularmente na reconstrução e reabilitação de instituições públicas de formação, pesquisa e extensão agrícola que foram destruídas durante a guerra civil, e, fortalecer a capacidade institucional dos ministérios responsáveis pela Agricultura e desenvolvimento rural, especialmente na formulação e monitoramento de políticas, programas e projectos agrícolas (Agricultura, silvicultura, pesca, pecuária). Nesse período, a parceria FAO-GoA resultou na implantação de mais de 233 projectos no valor de mais de US 138 milhões.

A FAO elaborou a “Agenda 2030” em vigor desde 1 de Janeiro de 2016, e deverá ser implementada durante os próximos 15 anos. Segundo o seu Relatório, para Angola, identificou alguns objectivos estratégicos, nas quais recomendam que sigamos com rigor, a sua implementação, nomeadamente:

– Promover uma campanha mais ampla de capacitação profissional e transferência de tecnologia, para otimizar a produção agrícola e a produtividade;

– Implementar um processo de transformação agrária e desenvolvimento rural baseado na Agricultura familiar, cooperativas e em parcerias público-privadas; e,

-Estabelecer um mecanismo de coordenação e sinergias entre diferentes sectores e outros actores nas áreas rurais, enfatizando a participação da sociedade no processo de desenvolvimento nacional, para contribuir para o processo de industrialização do País.

Tal como foi mencionado na primeira parte desta pesquisa, os esforços têm sido feitos, porém, há ainda muito por fazer, alcançar as metas e os objectivos preconizados, é possível. Angola é por ironia do destino um País abençoado por Deus, desde o clima aos solos, desde sua população, predominante jovem, aos vastos rios e lagos, enfim, temos tudo o que precisamos em abundância, só depende de nós (angolanos).

Por essa Pátria que eu amo!

Paulo Gungui

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