Entre as alterações mais significativas trazidas pela Lei n.º 10/21, de 22 de Abril – Do Investimento Privado (na sua versão republicada), doravante “LIP”, sem sombra de dúvidas que merece destaque a eliminação, entre as formas realização do investimento privado, da tecnologia e o know how[1].
As alíneas e dos art.ºs 8 e 10, da versão anterior da Lei, previam a referida forma de realização de investimento privado. No entanto, do ponto de vista operacional convocavam-se vários problemas, pois colocava-se a questão de saber sobre como se deveria poderia proceder à avaliação pecuniária da tecnologia ou do conhecimento, que fosse susceptível de avaliação de pecuniária no âmbito dos projectos de investimento privado levando a que este se reflectisse no valor global do investimento.
Num artigo que publicamos em 2019[2], por via do qual abordamos com suficiência a questão retro, notamos que a resposta àquela questão não era fácil, primeiro, porque a Lei da Propriedade Industrial (a seguir “LPI”) não prevê normas específicas e, segundo, porque o Instituto Angolano de Propriedade Industrial (também conhecido por “IAPI”), órgão que administra os direitos da propriedade industrial não dispõe de condições técnicas, humanas e matérias para proceder à certificação.
Em face disso, tínhamos apontado três recomendações, que passavam por (i) se aprovar, com carácter de urgência de uma nova Lei da Propriedade Industrial alinhada com o trabalho que estava – e persiste – a ser levada a cabo em relação à reformação da política, quadro legal e procedimental do investimento privado; (ii) a aprovação de mecanismos de estímulos, para os benefícios e facilidades que já existem, com vista à atracção de investimento que se revista em tecnologia ou know how; e (iii) a criação, igualmente urgente, de adequadas condições técnicas e materiais para assegurar a célere certificação da tecnologia ou do conhecimento.
A solução da versão republicada da LIP, nesta questão particular da actração de investimento que consista em activos intelectuais, constitui um claro retrocesso. A diversificação económica que se quer, implica um enorme investimento no sector produtivo e consequentemente em novas tecnologias. Este facto é revelador da necessidade de potenciação de investimento que se realizada desta forma.
Embora para o actual estado de desenvolvimento os recursos financeiros e equipamentos ou máquinas se afigurem igualmente pertinentes e oportunos, a política de actração e protecção do investimento privado em Angola deve também se centrar nos activos intelectuais. A invenção de processos de fabricação de produtos, máquinas e equipamentos requer grandes investimentos e é preciso, reiteramos, que exista uma ampla protecção do ordenamento jurídico angolano que possa ser gerador de confiança, para além de outros medidas que possam concorrer para o mesmo objectivo.
Não nos podemos ficar por normas genéricas, como a que alude o n.º 1 do art.º 16 da LIP, que assegura a protecção da propriedade intelectual nos termos da Lei. Impõe-se uma verdadeira reforma, nos termos que já nos ativemos, porquanto o regime jurídico aplicável à propriedade industrial – que a par dos Direitos de autor e conexos integram o direito da propriedade intelectual – já não serve. Está caduco, pois é de 1992.
O comprometimento do Estado com o fomento e a protecção da propriedade intelectual eflui da CRA. Vide art.º 42/4.
Há, alguma evolução na preocupação com o tema, sendo exemplo disso, a criação de uma Sala específica, ao nível do Tribunal Provincial de Luanda, com a competência de resolver conflitos de natureza comercial, intelectual e industrial, mas isto é insuficiente pois o sistema tem de mudar como um todo-
Sugere-se, por isso, a busca de soluções práticas que permitam ultrapassar os problemas de certificação que sempre se colocaram às formas realização do investimento privado, em estudo, e não a sua eliminação da LIP. A solução, salvo melhor entendimento, passa pela modernização do sistema nacional de propriedade intelectual a todos os níveis (legal, procedimental, material e humano), tornando-o capaz de fazer a tal certificação de acordo com o sistema internacional, de que Angola até é parte, e a absorção desta tecnologia permitindo a criação de avanços tecnológicos e a geração de tecnologia própria[3].
[1] Neste artigo, acolhemos o conceito de DANIELA ZAITZ, Direito & Know How, Uso, Transmissão e Protecção de conhecimentos Técnicos ou Comerciais de Valor Económico, Jurua Editora, Curitiba, 2005, p. 39, segundo o qual o know how designa “(…) conhecimentos técnicos (não patenteados) ou comerciais que têm um valor económico e possam ser transmissíveis, sejam secretos ou relativamente secretos (…) e que tragam vantagem competitiva para o seu detentor”.
[2] Disponível em https://angolaforex.com/2019/03/24/specialist-ao-dr-moses-caiaia-o-problema-da-avaliacao-pecuniaria-da-tecnologia-ou-do-conhecimento-que-consista-em-investimento-nos-termos-da-lei-n-o-10-18-de-26-de-junho/
[3] LUIZ ALFREDO PAULIN, A tecnologia e a sua importância, in: MARCOVITCH, Jacques (Coord.), Cooperação internacional: estratégia e gestão, São Paulo: EDUSP, 1994, p. 624, referindo-se sobre se a importação de tecnologia resolve ou não o problema da dependência, nos países em desenvolvimento, entende que a criação de avanços tecnológicos e a geração de tecnologia própria implica a existência de mão-de-obra capacitada é fundamental para a absorção da tecnologia importante.