Specialist AO – Dr. Moses Caiaia – O contrato de investimento privado e o processo de negociação. Questões várias (I)

A Lei n.º 10/21, de 22 de Abril e o Decreto Presidencial n.º 271/21, de 16 de Novembro, que republicam, a Lei n.º 10/18, de 10 de Março (Do Investimento Privado) e o Decreto Presidencial n.º 250/18, de 30 de Outubro (que aprova o Procedimento para a realização do Investimento Privado), reintroduzem, no ordenamento jurídico angolano, a figura do contrato de investimento privado que já mereceu a nossa apreciação em relação aos critérios que o podem levar a ser uma opção para os investidores privados.

O referido contrato, como resulta dos diplomas retro, implica uma negociação entre a AIPEX (enquanto representante do Estado) e o investidor privado. A proposta contratual deve, essencialmente, prever as cláusulas constantes no art.º 11 – A do DP n.º 271/21, nomeadamente, a identificação das partes, a identificação da Sociedade-Veículo, os objectivos do projecto, o prazo de conclusão, a força de trabalho, o montante de investimento, as formas de realização, o financiamento, facilidades e benefícios fiscais, localização do investimento e benefícios fiscais.

Para além da referida caracterização, o Decreto retro confere ao contrato de investimento privado uma natureza administrativa aplicando-se-lhe, por isso, o quadro legal aplicável à actividade administrativa. Ademais, o mesmo Decreto, fixa os termos gerais do ritual subjacente à instrução da proposta de investimento no regime contratual, mormente quanto aos prazos para a AIPEX decidir.

Através do presente artigo, que será apresentado em duas partes, sendo esta a primeira, pretendemos analisar algumas questões atinentes quer à proposta contratual quer ao seu processo de negociação até as partes lograrem um acordo. Assim, começaremos por analisar as principais cláusulas contratuais e algumas questões que as mesmas suscitam.

A identificação das partes é o primeiro aspecto a considerar em relação a qualquer proposta contratual. Como já aludimos, em representação do Estado, nos contratos de investimento intervém a AIPEX, sendo contraparte o investidor privado, identificado pela sua natureza (pessoa singular ou colectiva), país de origem, sede social ou domicílio e o seu representante para o vincular (sendo normalmente o representante do órgão de gestão/administração). A respeito da aludida representação, convém notar que fora o investidor privado ou um membro do órgão de representação apenas advogados constituídos (junta para o efeito Procuração) podem assumir a representação, por força do disposto na Lei n.º 8/17, de 13 de Março – que fixa o Regime Jurídico sobre o Exercício da Advocacia em Angola.

No que toca à identificação da Sociedade-Veículo, o segundo elemento essencial em relação ao contrato em alusão, tem havido algumas dúvidas por parte dos investidores privados ou seus representantes, pois muitas vezes julgam que só deve ser a entidade promotora – sendo ela sociedade comercial – a assumir tal qualidade. Não é verdade.

A sociedade executora será aquela que, de acordo com a vontade do investidor e desde que não haja nenhum condicionalismo legal, será aquela a quem caberá a objectivação do projecto. Também não tem que ser, no caso em que o projecto implica a constituição de uma sociedade comercial, esta mesma sociedade.

Em relação ao objectivos do projecto, de um modo geral, os investidores privados optam por consagrar aqueles que veem previstos no art.º 22 da LIP republicada e que se referem aos fins subjacentes à atribuição de benefícios e facilidades face à política de investimento privado em vigor. Num ou outro caso, no contrato procura-se aumentar, diminuir e/ou ajustar os objectivos de acordo com o objectivo concreto de cada projecto, mas isto ocorre excepcionalmente.

O prazo de conclusão é dos aspectos que, nos parece, requer cuidada atenção, porquanto tem permite definir o Estatuto a ser atribuído ao investidor privado do promotor do projecto que estiver em causa. Há casos, e são a maioria, em que os investidores optam por consagrar uma duração indeterminada, mas existem também aqueles casos em que os projectos têm uma duração determinada. É o que se verifica sobretudo nos casos em que os projectos visam objectivos claros, sendo comum nos casos em que investidores intervêm organizados em consórcio.

Também o prazo de conclusão assume especial importância, pois justifica o cronograma de execução do projecto, que constitui – por força da Lei – anexo ao contrato de investimento privado. É, especialmente por esta razão, que a nossa experiência recomenda que o investidor privado procure fixar prazos realistas e consentâneos com a sua capacidade financeira, sob pena de ter que requerer a alteração atinente ao prazo inicial, o que representa um esforço financeiro adicional (porque se impõe o pagamento de emolumento) e não é certo que venha a ser aceite pelo Estado porquanto a Lei sujeita à decisão de deferir este pedido à AIPEX tendo em atenção a fundamentação apresentada pelo mesmo investidor.

Ainda sobre o prazo de conclusão, importa frisar que o seu incumprimento sem causa plausível faz o investidor incorrer em transgressão à LIP, o que pode originar o pagamento de uma multa, a retirada dos benefícios que eventualmente tenham sido atribuídos e a revogação da autorização de investimento privado.

A cláusula sobre a força de trabalho do projecto também requer cuidada atenção, sendo importante que o investidor apresente expectativas e objectivos reais. O primeiro impacto deste aspecto prende-se com o facto de poder, a par do valor do contrato, justificar a escolha do regime contratual na medida em que a Lei define ambos como critérios a considerar.

Além que notamos, a força de trabalho nos projectos de investimento privado sofre um conjunto de limitações, desde logo porque a força expatriada não pode ultrapassar 30% do global do projecto. Também, havendo a referida força de trabalho, a Lei exige que exista um plano de substituição gradual da mesma por nacionais e, igualmente, exige que o investidor privado apresente um plano de formação da força de trabalho nacional.

Tal como sucede no caso do cronograma de execução do projecto, os planos de substituição e de formação que aludimos, constituem anexo ao contrato de investimento privado.

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